O Homem é a medida de todas as coisas
Protágoras
Estas afirmações, que surge de um grego do século V a.C., permanecem fresca e viva. É ainda uma chamada à reflexão, de incalculável valor para todos nós, homens do século XX.
Alguns estudiosos quiseram ver nesta especial posição do contemporâneo de Péricles, um antropocentrismo que poderia roçar com a negação de Deus.
Nada há de mais equivocado.
Os antigos não concebiam o homem numa posição dialéctica com a Natureza Divina, mas como uma chave que podia abrir as portas secretas de tudo o que é manifestado e do que mais tarde se chamaria «metafísico». O homem concebeu-se como enxertado em Deus e mesmo como Deus numa das suas expressões sensíveis e, sobretudo, inteligíveis.
O decurso da história foi precipitando pouco a pouco a Humanidade no culto do «bezerro de ouro» dos sistemas anti-naturais, que paulatinamente nos afastaram desses outros «sistemas» da natureza Divina. Não nos soubemos adaptar – talvez por pecado de orgulho – às Leis Fundamentais que regem o Cosmos, e inventamos outras que foram desviando a corrente da Vida do seu curso natural.
As máquinas, instrumentos do homem, prolongamento das suas pernas, mãos e cérebro, deslumbraram com a sua força aquele que as havia criado, e assim nasceu uma nova mitologia pela qual o homem se foi convertendo num alucinado, sem outra medida do que a sua própria fantasia e vaidade.
Esta forma particular de loucura colectiva, sonhada durante vários séculos, planeada no século XIX e plasmada no XX, criou em nós uma grande dependência que nos desumanizou. E o que é pior, converteu-nos em contaminadores do nosso belo planeta, o qual ficou enfermo, talvez de forma irreversível, com os excrementos das nossas máquinas: a poluição.
As últimas investigações assinalam que a camada de ozônio que nos protegia dos raios cósmicos tinha apenas, próximo do Pólo Sul, um pequeno orifício para a circulação da energia que os esoteristas chamaram o chakra sul do planeta, e este foi-se alargando ate chegar a zonas próximas da Austrália e da Patagónia. As consequências disto são terroríficas, e já se fazem notar num aumento de diversas formas de câncer da pele em homens e animais, e num transtorno de todo o ecossistema, incluindo a imprescindível flora marinha.
Na Europa os bosques vão desaparecendo com as previsíveis sequelas climáticas negativas. Calcula-se que por cada ano que passa desaparecem, no planeta, zonas verdes equivalentes a duas vezes a superfície da Suiça.
Esta contaminação não é somente física nem tão pouco energética, pois esta alcançando os planos psicológicos nos quais se move a mente do homem.
Talvez seja um erro afirmar que o incremento do uso de drogas é o causador de muitos desvarios. O mais provável é que o homem, com a angústia própria de uma forma de vida suja e anti-natural, recorra às drogas como um meio para escapar a uma realidade que não pode dominar. Os suicídios de crianças, a violência e o terrorismo são também subprodutos desta obscura forma de desespero que, de alguma forma, nos está a atacar a todos.
Nos primeiros dia do passado mês de Setembro, uma avioneta chocou no ar com um avião de reacção das Linhas Aéreas Mexicanas sobre o céu de Los Angeles, USA. Morreram todos os que voavam e também cinco pessoas que estavam em terra e que receberam os estilhaços metálicos da deflagração.
Isto pareceu, no princípio, apenas mais um acidente.
Porém, as investigações efectuadas no aeroporto de Los Angeles demonstraram que se tratou de uma falha humana. Esta falha humana, pelas suas características, despertou as suspeitas do pessoal de investigação, e assim se comprovou que mais de cinquenta por cento dos controladores aéreos se drogavam de alguma maneira. Interrogados sobre a razão pela qual o faziam, responderam que por stress ou angústia, confusão de ideias e impulsos irracionais que de outra forma não podiam controlar. Por outras palavras: o «sistema» os estava tornando loucos com os seus écrans de radar e seus múltiplos aparelhos, que os bombardeavam com seus estímulos cibernéticos de luzes e sons, exigências de decisões instantâneas, repetição maquinal das mesmas complicadas acções todos os dias, todos os meses, todos os anos.
No início de 1986 o sofisticado «Challenger», transportador espacial, rebentava por entre labaredas perante os olhos de milhões de pessoas, antes de sair da atmosfera. A comissão de peritos acaba de dar o seu primeiro veredicto: falha humana que se vinha repetindo no ajuste de certas peças desde há muito tempo atrás e ninguém o notava… porque as maquinas não estavam programadas para tal coisa, e porque o cansaço-loucura fez com que, mesmo conhecendo o perigosíssimo fracasso da tecnologia, ninguém se atrevesse a denuncia-lo a tempo. A robotização foi tão grande que se tardou seis meses sem saber que a cápsula espacial tinha caído no mar inteira, com os seus ocupantes vivos a bordo até o impacto.
Não há muito tempo atrás que em Chernobyl, Ucrânia Soviética, uma central de energia atómica rebentou, causando a morte de milhares de pessoas e a contaminação de milhões em grande parte da Europa. Durante meio século, plantas, animais e homens de uma superfície de meio milhão de quilômetros quadrados sofrerão doenças e mortes prematuras. Investigando o acidente, descobriu-se que, uma vez mais, fora produzido por falha humana. Falha de muitos homens através de vários meses; o «sistema» tinha-os tornado praticamente estúpidos e carentes de capacidade de raciocínio normal e de reação.
Para não citar mais exemplos, há um mês atrás chocaram dois navios no Mar Negro, URSS, tendo como resultado o afundamento, em poucos minutos do velho barco chamado agora «Almirante Najimov», e que há cinquenta anos se chamou «Berlim», barco hospital lançado à agua em 1925. Ia carregado de turistas de boa classe, como se diz na Rússia, com todas as suas luzes acesas e bailes a bordo. Durante meia hora manteve-se contacto visual com um grande cargueiro, moderno e veloz, que acabou por colidir, perante a estupefacção de todos, com o velho barco partindo-o praticamente em dois. Morreram com toda a certeza oitenta e oito pessoas e «desapareceram» outras quatrocentas. Como se salvaram ambos os capitães, talvez seja possível esclarecer satisfatoriamente as causas de tão tragicómico acidente. Mas os primeiros resultados já foram dados: falha humana.
Somando estes casos, notáveis pela sua relevância, as diferentes formas de terrorismo que vão desde o assalto e disparos de metralhadoras contra os passageiros do «Jumbo» da PAN AM ou os fiéis da sinagoga de Istambul, até ao reaparecimento dos piratas armados de punhais no Alto Nilo, que se dedicam a violentar as humilíssimas barcas de uma vela, o resultado surpreende-nos e coloca-nos diversas questões.
A primeira é: será que os propalados sistemas democrático e marxista são tão eficazes como esta na moda dizer ou, pelo contrário, não passam de desvios opressores do homem, que o estão tornando louco por acumulação de burocráticas responsabilidades artificiais, sangria económica continua culto idolátrico à máquina?
A segunda: serão estes sistemas capazes de se regenerarem a si mesmos, contradizerem as suas essências e renunciarem ao «mito» da igualdade ou ao progresso indefinido graças a uma tecnologia de ponta?
A terceira: será que a Humanidade viveu tantos milhões de anos para acabar convertendo-se num inferno povoado de seres doentes, com um subconsciente criminoso à flor da pele, sonhando com o ópio de conquistar longínquas galáxias enquanto que o seu nível de vida decai constantemente para a animalidade estúpida da robotização, da crueldade e da inércia, carente dos mínimos reflexos de sobrevivência que ate as próprias amebas possuem?
A nossa condição de filósofos força-nos a tão triste reflexões que nada têm a ver com o «catastrofismo», mas com uma realidade que se torna dia após dia mais visível e palpável.
Não nos podemos desentender face a um problema que nos afeta a nós e a todos os seres do planeta, pois na nossa louca necessidade, vamos legar às gerações futuras um teatro de vida desolado, repleto de animais e árvores mortas; milhares de milhões de seres humanos subalimentados, desesperados, drogados e tristes, carentes de esperança e de fé em si mesmos e em Deus.
Não será a hora de revermos seriamente os nossos esquemas políticos, sociais e religiosos?
Será que o homem está realmente progredindo?
É evidente que um carro na Suméria, há 5.000 anos atrás, carecia do conforto e da possibilidade de desenvolver a velocidade de um automóvel moderno, e a diferença acentua-se se considerarmos os cometas chineses da dinastia Tang para um só homem, e os actuais aparelhos de voo B. 747 E, com capacidade para mais de 400 passageiros e uma velocidade próxima dos 1.000 quilómetros por hora, a 10.000 metros de altitude.
Porém, estas enormes diferenças deram-se nas máquinas ou nos homens que as tripulam e utilizam?
Poderíamos assegurar, poderíamos jurar, que o condutor sumério ou o observador aéreo chinês eram realmente inferiores ao piloto das nossas maravilhosas máquinas?
Não.
E será que o astronauta que conduz uma nave espacial é mil vezes superior ao corajoso chinês que voava atado ao seu cometa feito de canas e seda?
Não.
Então… o que é que melhorou, evoluiu, se aperfeiçoou: a maquina ou o homem?
Evidentemente, a maquina. O homem, a julgar pelos seus pensamentos, emoções e actos, é mais ou menos o mesmo… se é que não é pior, considerando as suas perturbações internas, a sua pouca capacidade de decisão, a vertigem psíquica que o leva a um estado continuo de tensão, de agressividade e de desprezo pelo equilíbrio ecológico do seu meio ambiente.
Serão, então, as maquinas um mal, como afirmou o Mahatma Ghandi? Não o cremos; antes pensamos que o valor humano foi postergado e que se confundiu o progresso técnico com o progresso humano. As máquinas não têm culpa; elas são engenhos magníficos da inventiva humana; mas essa inventiva, ao não ser canalizada pelo caminho justo tornou-se prejudicial e arrasta-nos para uma sequela de desgraças, acidentes fatais e degradação moral.
Urge recuperar o valor humano. Impõe-se uma nova educação baseada nos valores permanentes, na possibilidade de sermos felizes e de aproveitarmos as riquezas (que hoje se esbanjam numa demencial corrida armamentista) em beneficio de uma sociedade melhor, mais bela e mais justa.
No horizonte da Historia futura deve amanhecer uma nova ordem que substitua a atual desordem; uma ética profunda e uma forma de vida natural que não necessitem de drogas para que um homem ou uma mulher jovem se sinta saudável e feliz.
Se não reagirmos a tempo, a Natureza inexorável fá-lo-á por nós através de novas pestes e cataclismos que preservarão a própria existência do planeta Terra.
Dizem os livros antigos que isso já sucedeu outras vezes.
Será que não aprendemos a lição?
Seria muito belo que recuperássemos, ainda que fosse paulatinamente e partindo de pequenos grupos, o valor humano. Não desesperar; com a ajuda omnipresente de Deus, tudo é possível. Mas devemo-nos esforçar para que isto se produza, e limpar de nossas consciências os nefastos vestígios que o espezinhamento politico, social e religioso nos produziram, deformando-nos, embrutecendo-nos, fazendo-nos perder…
Autor: Jorge Angel Livraga Rizzi