Bom, continuando a série começada semana passado com o Rei do Rock, nesta semana o disco a ser comentado não é de fácil digestão! Aborda um tema delicado em todos os sentidos: a mulher.
A obra é fruto de extensa pesquisa do próprio compositor sobre a segregação da mulher na sociedade moderna e em toda história da humanidade, qual seu papel e qual seu valor.
A forma que a obra aborda o assunto é bastante peculiar. Através de elaborada trama, faz uma espécie de enredo musical onde cada música se liga a próxima, perfazendo três ATOS distintos mas interligados, como em uma opereta. De um lado um coral de acusadores inicia contundente:
Mulher é o mal
Que Lúcifer bota fé.
Quando achou
Primeiro ovo do Cão
Ela chocou.Cru, Belzebu
Do rabo fez um pirão
Foi o pão
Que o diabo amassou
E ela assou.
A resposta vem em seguida, a mulher, já “avexada” pede que pare de pegar no pé, deixando claro o quanto a discussão é boba. Os acusadores ainda reconhecem:
Eu sei que é
Perder meu tempo
Agir assim;
É prolongar
Inimizade velha que dói.
Se a mulher
Deixar de
Confiar em mim
Eu vou parar
Onde não dá pra parar.
A discussão ainda toca num ponto delicioso:
Se você vem numa boa
Pode vir,
Também não tô à-toa.
Eu te boto no colo,
Te dou pão e mingau.
Mas se você vem de cacete,
Pode vir
Que eu vou de pedra e pau.
Engraçado isso. A mulher tem essa particularidade de estar pronta pra guerra e, ao mesmo tempo, se o homem “vem na boa”, ela “bota no colo, dá pão e mingau”. A mulher está sempre pronta para ser um doce ou amargar feito o fel, se necessário.
Amansado pelo pão e mingau, o Estúpido Rapaz destrincha sua proposta de amor, reconhecendo seu jogo sujo e oferecendo uma trégua:
Ó garota,
Eu contra ti já inventei os deuses, a lei,
E pela carne do pecado te condenei
Tô convencido que essa guerra suja
Foi longe demais
E te ofereço um acordo de paz.
Assim será!Em muitos países do mundo a garota
Também não tem o direito de ser.
Alguns até costumam fazer
Aquela cruel clitorectomia.Mas no Brasil ocidental civilizado
Não extraímos uma unha sequer
Porém na psique da mulher
Destruímos a mulher.Assim Será…
Já contando com o êxito, aguarda a resposta.
Ora, então é assim. Bate o arrependimento, arrepende-se pede desculpa e pronto? Fácil não?
Bom, não é bem assim…
Assim será o quê, seu vagabundo?!
A mulher pede para pensar no assunto:
Quero pensar, meu bom rapaz,
Numa boa:
Não se dá um “sim” assim à-toa.
Quero pensar, meu bom rapaz
Aqui uma alfinetada, típica do Tom Zé, referindo-se a qual “Eternidade” a mulher sonha:
Felicidade sim, sonhar, sonhar
O eterno amor sonhar
Em termos ancestrais.
Não aquela eternidade
De Vinicius de Moraes.
Tristeza não, tristeza fim,
Tristeza bem longe de mim.
A faixa termina com um “talvez” mas pede antes:
Então tá, meu bom rapaz. Vou pensar no seu caso. Mas primeiro quero lhe mostrar algumas das crueldades que caíram sobre a mulher nestes séculos. Então fique aí escutando, vamos ver.
Mulher Navio Negreiro, demonstra a dor enraizada nesta relação, e que ninguém suspeita. Uma frase curiosa é a analogia entre Banca de Jornal e Açougue, ambos vendendo carne. Uma bovina, outra humana, referindo-se a nudez feminina estampada em plena praça.
A próxima faixa, outra alfinetada a Bossa Nova.
Bom, mas vou parar por aqui se não você não escuta o disco.
Ficou curioso, não perde tempo download em: http://tinyurl.com/362rkmw
Bom, antes de terminar o Post, gostaria apenas de comentar uma faixa deste disco que acho muito bela, tanto do ponto de vista musical quanto poético. Chama-se “Duas Opiniões”. Trata-se de uma canção feita em contra-ponto, ou seja são duas canções em uma. As vozes se sobrepõem formando uma deleite harmônico para bons ouvintes.
Já a poesia, são definitivamente duas opiniões opostas… e como sempre, uma alfinetada… acompanha… muito legal!
DUAS OPINIÕES - Tom Zé
Zélia Bamba: Ridículo chorar,
Patético viver,
Paradoxal prazer,
Apologia do sofrer.Mônica Sol-Musa: Leal, fiel,
Ilusão
Não sabe quem não quer
Meu bem chora porSoluço pra te ver chorar
Cantando venho soluçar.
Recitativo-fuxico de Maneco Tatit: Mas meninas, vocês souberam? Foi o pagode, foi o pagode. Foi o pagode, esse alcoviteiro sem vergonha, lascivo, que foi perverter, desviar, desatinar a cabeça de um rei da Inglaterra, que largou a coroa, largou tudo por causa desse pagode. Esse facilitador de namoro! E não respeita uma potência como a Inglaterra! Que sujeito subvertedor da ordem, do respeito, da lei! Até na Inglaterra...
Zélia Bamba: Até na Inglaterra
Ele destronou
Um rei
Que por sua paixão
Abandonou o trono
E a lei.
Até Santo Augustinho
Por amor
Foi sua presa
E Deus, para esperá-lo
Assistiu
muita proeza.
No pagode,
Decoro
Não tem lugar;
É useiro
VezeiroMônica Sol-Musa: Ôô
Aquele
Da sedução
Ôô
A corte
Deixou de mão
Ôô
Viveu
Pecado só
Sentiu
Em si
Carne e pó
É carne
Senhor, tem dó
De ter em si
Pecado e póZélia Bamba e Mônica Sol-Musa: Em mal ma ma ma ma ma maltratar.
E, finalmente pra finalizar, entrevistas realizadas pela TRAMA sobre o disco, dá o Play: